Brasília, 15 a 19 de maio de 2017 - Nº 865.
Este Informativo, elaborado com base em notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
SUMÁRIO
Plenário
Direito à aposentadoria especial de servidor público com deficiência e parâmetro legislativo
Ausência de apresentação de contrarrazões e honorários recursais
‘Habeas corpus’ impetrado contra decisão de ministro do STF
Repercussão Geral
Tráfico de drogas e confisco de bens
1ª Turma
Crime de divulgação de informação falsa sobre instituição financeira e imunidade parlamentar
2ª Turma
Reclamação, preso advogado e execução provisória da pena
Reclamação e índice de correção de débitos trabalhistas
Clipping da Repercussão Geral
Transcrições
Prisão cautelar - Duração excessiva - Inadmissibilidade (HC 139.664/GO)
PLENÁRIO
Video:
DIREITO CONSTITUCIONAL: GARANTIAS CONSTITUCIONAIS
Direito à aposentadoria especial de servidor público com deficiência e parâmetro legislativo
O Plenário retomou julgamento de agravo regimental em agravo regimental em mandado de injunção em que se discute qual parâmetro legislativo deve ser aplicado para regulamentar o direito à aposentadoria especial de servidor público com deficiência.
No caso, o mandado de injunção foi impetrado haja vista a ausência de norma específica para o gozo do direito em questão.
O ministro Edson Fachin, em voto-vista, deu provimento ao agravo regimental. Determinou que a aposentadoria do servidor público com deficiência (CF, art. 40, § 4º, I) tenha a Lei Complementar 142/2013 como parâmetro normativo, no que couber.
Afirmou que, diante da inexistência de legislação sobre a aposentadoria especial de pessoa com deficiência, o Supremo Tribunal Federal (STF) aplicava, por analogia, o art. 57 da Lei 8.213/1991 – que trata exclusivamente das aposentadorias dos segurados submetidos a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física – para suprir a omissão.
Sublinhou que, com a Lei Complementar 142/2013, que regulamentou a aposentadoria do segurado do Regime Geral de Previdência Social com deficiência (CF, art. 201, § 1º), a solução mais adequada a ser dada pela Corte à situação dos servidores é a utilização integral dessa norma para suprir a lacuna.
A omissão quanto à regulamentação infraconstitucional de dispositivo garantidor de direito deve ser suprida pelo Judiciário mediante a aplicação da legislação em vigor que, por analogia, melhor se amolde ao caso concreto. Se atualmente a lei complementar é a legislação vigente específica para as aposentadorias dos segurados com deficiência, então esse normativo é, a partir de sua entrada em vigor, o mais adequado para suprir a omissão inconstitucional no tocante ao servidor público.
O ministro Luiz Fux (relator) reajustou o voto na linha do voto-vista do ministro Edson Fachin e foi acompanhado pelos ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cármen Lúcia.
Em seguida, o julgamento foi suspenso por indicação do relator.
MI 1613 AgR-AgR/DF, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 18.5.2017. (MI-1613)
Video:
Áudio :
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - HONORÁRIOS RECURSAIS
Ausência de apresentação de contrarrazões e honorários recursais
É cabível a fixação de honorários recursais, prevista no art. 85, § 11 (1), do Código de Processo Civil (CPC), mesmo quando não apresentadas contrarrazões ou contraminuta pelo advogado.
O Tribunal, por unanimidade, negou provimento a agravo regimental em ação originária e, por maioria, fixou honorários recursais.
Quanto à fixação de honorários recursais, prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux, que confirmou o entendimento fixado pela Primeira Turma. Para ele, a sucumbência recursal surgiu com o objetivo de evitar a reiteração de recursos; ou seja, de impedir a interposição de embargos de declaração, que serão desprovidos, independentemente da apresentação de contrarrazões. A finalidade não foi remunerar mais um profissional, porque o outro apresentou contrarrazões.
O ministro Edson Fachin afirmou que a expressão “trabalho adicional”, contida no § 11 do art. 85 do CPC, é um gênero que compreende várias espécies, entre elas, a contraminuta e as contrarrazões.
Vencidos, nesse ponto, os ministros Marco Aurélio (relator), Celso de Mello e Cármen Lúcia, que não fixaram os honorários, considerada a inércia do agravado em apresentar contraminuta ao agravo interno. O ministro Marco Aurélio asseverou que, sem a apresentação de contrarrazões nem de contraminuta, não há como aditar os honorários anteriormente fixados.
(1) Código de Processo Civil/2015: “Art. 85. A sentença condenará o vencido a pagar honorários ao advogado do vencedor. (...) § 11. O tribunal, ao julgar recurso, majorará os honorários fixados anteriormente levando em conta o trabalho adicional realizado em grau recursal, observando, conforme o caso, o disposto nos §§ 2º a 6º, sendo vedado ao tribunal, no cômputo geral da fixação de honorários devidos ao advogado do vencedor, ultrapassar os respectivos limites estabelecidos nos §§ 2º e 3º para a fase de conhecimento”.
AO 2063 AgR/CE , rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Luiz Fux, julgamento em 18.5.2017. (AO-2063)
Áudio :
DIREITO PROCESSUAL PENAL: “HABEAS CORPUS”
‘Habeas corpus’ impetrado contra decisão de ministro do STF
Não cabe “habeas corpus”, se a impetração for ajuizada em face de decisões monocráticas proferidas por ministro do Supremo Tribunal Federal.
O Plenário, por maioria, não conheceu do “writ” impetrado contra decisão de ministro desta Corte que determinou a custódia cautelar do paciente.
Vencido o ministro Marco Aurélio (relator), que julgou prejudicada a impetração ante a revogação da prisão preventiva do paciente.
HC 115787/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, red. p/ o ac. Min. Dias Toffoli, 18.5.2017. (HC-115787)
Áudio :
REPERCUSSÃO GERAL
DIREITO CONSTITUCIONAL - CONFISCO
Tráfico de drogas e confisco de bens
É possível o confisco de todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico de drogas, sem a necessidade de se perquirir a habitualidade, reiteração do uso do bem para tal finalidade, a sua modificação para dificultar a descoberta do local do acondicionamento da droga ou qualquer outro requisito além daqueles previstos expressamente no art. 243, parágrafo único (1), da Constituição Federal (CF).
O Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o Tema 647 da repercussão geral, por maioria, deu provimento ao recurso extraordinário interposto contra acórdão que determinou a devolução de veículo de propriedade de acusado pela prática do crime de tráfico de entorpecentes, sob o fundamento de que a perda do bem pelo confisco deve ser reservada aos casos de utilização do objeto de forma efetiva, e não eventual, para a prática do citado delito.
Prevaleceu o voto do ministro Luiz Fux (relator). Para ele, o confisco de bens pelo Estado encerra uma restrição ao direito fundamental de propriedade, garantido pelo art. 5º, “caput” e XXII, da CF (2).
Asseverou que o confisco de bens utilizados para fins de tráfico de drogas, da mesma forma como as demais restrições aos direitos fundamentais expressamente previstas na Constituição Federal, deve conformar-se com a literalidade do texto constitucional, vedada a adstrição de seu alcance por outros requisitos que não os estabelecidos pelo art. 243, parágrafo único, da CF.
Consignou que o confisco, no direito comparado, é instituto de grande aplicabilidade aos delitos de repercussão econômica, sob o viés de que “o crime não deve compensar”. Tal perspectiva foi adotada pelo constituinte brasileiro e pela República Federativa do Brasil, que internalizou diversos diplomas internacionais que visam reprimir severamente o tráfico de drogas.
Observou que o tráfico de drogas é reprimido pelo Estado brasileiro, por meio de modelo jurídico-político, em consonância com os diplomas internacionais firmados. Os preceitos constitucionais sobre o tráfico de drogas e o respectivo confisco de bens constituem parte dos mandados de criminalização previstos pelo poder constituinte originário a exigir uma atuação enérgica do Estado sobre o tema, sob pena de o ordenamento jurídico brasileiro incorrer em proteção deficiente dos direitos fundamentais.
Segundo o relator, o confisco previsto no art. 243, parágrafo único, da CF deve ser interpretado à luz dos princípios da unidade e da supremacia da Constituição, ou seja, não se pode ler o direito de propriedade em separado, sem considerar a restrição feita a esse direito. Concluiu que a habitualidade do uso do bem na prática criminosa ou sua adulteração para dificultar a descoberta do local de acondicionamento, “in casu”, da droga, não é pressuposto para o confisco de bens nos termos do citado dispositivo constitucional.
Vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, que negaram provimento ao recurso.
Para o ministro Ricardo Lewandowski, deve prevalecer a regra constitucional da proibição do confisco, observados, ainda, os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. No caso, para ser confiscado, seria necessário provar que o veículo teria sido destinado integralmente para a prática do delito. Além disso, considerou que o parágrafo único do art. 243 não é um dispositivo independente, mas deve ser lido em harmonia com o seu “caput”, o qual diz respeito apenas a propriedades rurais e urbanas de qualquer região do País onde forem localizadas culturas ilegais de plantas psicotrópicas ou a exploração de trabalho escravo na forma da lei.
O ministro Marco Aurélio, de igual modo, emprestou ao parágrafo único do citado artigo a disciplina de simples acessório, a remeter, necessariamente, a bens encontrados na propriedade objeto de expropriação.
(1) Constituição Federal/1988: “Art. 243. As propriedades rurais e urbanas serão expropriadas e destinadas à reforma agrária e a programas de habitação popular, sem qualquer indenização ao proprietário e sem prejuízo de outras sanções previstas em lei, observado, no que couber, o disposto no art. 5º.
Parágrafo único. Todo e qualquer bem de valor econômico apreendido em decorrência do tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e da exploração de trabalho escravo será confiscado e reverterá a fundo especial com destinação específica, na forma da lei”.
(2) Constituição Federal/1988: “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) XXII – é garantido o direito de propriedade”.
RE 638491/PR, rel. Min. Luiz Fux, julgamento em 17.5.2017. (RE-638491)
Video:
Áudio :
PRIMEIRA TURMA
DIREITO PENAL – IMUNIDADE PARLAMENTAR
Crime de divulgação de informação falsa sobre instituição financeira e imunidade parlamentar
A Primeira Turma, por maioria, admitiu a impetração e, por unanimidade, concedeu ordem de “habeas corpus” para cassar acórdão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região que condenou parlamentar pela prática do delito de divulgação de informação falsa ou prejudicialmente incompleta sobre instituição financeira, previsto no art. 3º da Lei 7.492/1986 (1).
No caso, o parlamentar convocou a imprensa e, no exercício da Presidência da Assembleia Legislativa do Estado do Espírito Santo, opinou sobre a conveniência da privatização do Banco do Estado do Espírito Santo (Banestes), ante a existência de dívida no valor de R$ 500 milhões.
A Turma pontuou que a declaração revelou a satisfação do parlamentar com a privatização do Banco, que implicaria desoneração de dívida do Estado. Entendeu que não ficou configurado, na conduta do paciente, o dolo de divulgar informação falsa ou incompleta sobre instituição financeira, pois as afirmações do parlamentar estavam ligadas a análises de operações realizadas pelo Banestes.
Nesse contexto, o Colegiado asseverou haver ligação entre o que foi veiculado e o exercício do mandato parlamentar. Tal aspecto foi potencializado pelo fato de as declarações terem ocorrido dentro da assembleia. Concluiu pelo não afastamento da imunidade parlamentar relativa às opiniões, palavras e votos, prevista no art. 53 (2), combinado com o art. 27, § 1º (3), da Constituição Federal.
(1) Lei 7.492/1986: “Art. 3º Divulgar informação falsa ou prejudicialmente incompleta sobre instituição financeira: Pena – Reclusão, de 2 (dois) a 6 (seis) anos, e multa”.
(2) Constituição Federal/1988: “Art. 53. Os Deputados e Senadores são invioláveis, civil e penalmente, por quaisquer de suas opiniões, palavras e votos”.
(3) Constituição Federal/1988: “Art. 27. O número de Deputados à Assembleia Legislativa corresponderá ao triplo da representação do Estado na Câmara dos Deputados e, atingido o número de trinta e seis, será acrescido de tantos quantos forem os Deputados Federais acima de doze. § 1º Será de quatro anos o mandato dos Deputados Estaduais, aplicando-se-lhes as regras desta Constituição sobre sistema eleitoral, inviolabilidade, imunidades, remuneração, perda de mandato, licença, impedimentos e incorporação às Forças Armadas”.
HC 115397/ES, rel. Min. Marco Aurélio, julgamento em 16.5.2017. (HC-115397)
SEGUNDA TURMA
DIREITO PROCESSUAL PENAL – EXECUÇÃO PROVISÓRIA DA PENA
Reclamação, preso advogado e execução provisória da pena
A Segunda Turma, por unanimidade, negou provimento a agravo regimental em reclamação no qual se pretendia a transferência do agravante de cela comum de estabelecimento prisional para sala de estado-maior em razão da sua condição de advogado preso provisoriamente.
A defesa sustentou que o agravante teria direito a permanecer custodiado em sala de estado-maior, nos termos do art. 7º, V, da Lei 8.906/1994 (1). A constitucionalidade dessa norma foi reconhecida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento da ADI 1.127/DF (2).
O Colegiado pontuou que a execução em debate diz respeito a acórdão penal condenatório proferido em segundo grau. Dessa forma, seguindo a orientação jurisprudencial do STF (3), ainda que não transitada em julgado a condenação do agravante, a prisão não mais se reveste de natureza cautelar, mas sim das características de prisão-pena, a qual exige a formulação de juízo de culpabilidade em título judicial condenatório.
Salientou ainda que a Corte não discutiu, na ADI 1.127/DF, se o direito de o advogado permanecer recolhido em sala de estado-maior se estenderia, ou não, ao preso em razão de acórdão penal condenatório de segundo grau. Nesse contexto, a Turma reputou ausente a estrita aderência do objeto do ato reclamado ao conteúdo da ação direta paradigma e concluiu pela impropriedade da reclamação constitucional.
(1) Lei 8.906/1994: “Art. 7º São direitos do advogado: (...) V – não ser recolhido preso, antes de sentença transitada em julgado, senão em sala de Estado Maior, com instalações e comodidades condignas e, na sua falta, em prisão domiciliar”.
(2) ADI 1.127/DF, DJE de 11.6.2010.
(3) HC 126.292/SP, Pleno, rel. min. Teori Zavascki, DJE de 17.5.2016: “(...) a execução provisória de acórdão penal condenatório proferido em grau de apelação, ainda que sujeito a recurso especial ou extraordinário, não compromete o princípio constitucional da presunção de inocência afirmado pelo art. 5º, LVII, da Constituição Federal”.
Rcl 25111 AgR/PR, rel. Min. Dias Toffoli, julgamento em 16.5.2017. (RCL-25111)
DIREITO DO TRABALHO – DÉBITOS TRABALHISTAS
Reclamação e índice de correção de débitos trabalhistas
A Segunda Turma iniciou julgamento de agravo regimental em reclamação no qual se discute o índice a ser utilizado na correção de débitos trabalhistas.
No caso, apontou-se como ato reclamado a decisão do juízo do trabalho da 8ª Vara do Trabalho da Comarca de Porto Alegre que homologou cálculos apresentados por perito contábil nomeado para proceder à liquidação dos débitos trabalhistas constituídos nos autos de reclamação trabalhista, afastando, a partir de 30.6.2009, o disposto no art. 39 da Lei 8.177/1991 (1).
O ministro Edson Fachin (relator) negou provimento ao agravo regimental. Entendeu haver ausência de pertinência específica do ato reclamado com as decisões nos processos paradigma [ADIs 4.357 e 4.425 (2)]. Sustentou ser incabível a reclamação constitucional fundada em decisão paradigma sem efeito vinculante e tomada em processo do qual a reclamante não foi parte.
O ministro Dias Toffoli deu provimento ao agravo e julgou procedente a reclamação na parte em que homologa a aplicação do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo Especial (IPCA-E) como índice de correção do débito trabalhista. Segundo o ministro, outra decisão deve ser proferida em respeito às circunstâncias do caso concreto e ao devido processo legal.
Pontuou que a instância reclamada se equivocou na compreensão da extensão das decisões nos julgados apontados como paradigma, os quais tiveram como objeto apenas as alterações no regime constitucional de pagamento das fazendas públicas por meio de precatórios implementadas pela Emenda Constitucional 62/2009.
Afirmou que a Justiça do Trabalho, ao modular a eficácia do disposto no art. 39 da Lei 8.177/1991, procedeu não apenas a uma aplicação equivocada do quanto decidido na Suprema Corte nos referidos paradigmas, mas também usurpou competência do STF para decidir, em última instância e com efeito uniformizador de jurisprudência no controle difuso, matéria constitucional com repercussão geral.
O ministro Dias Toffoli ressaltou que, na Rcl 22.012 MC/RS (3), de sua relatoria, foi determinada a suspensão da decisão do Tribunal Superior do Trabalho na qual se fundou o ato ora reclamado. Salientou que foi aplicado o entendimento de que a suspensão deve ser respeitada por todos os órgãos da Justiça do Trabalho.
O ministro Edson Fachin indicou adiamento para análise da controvérsia.
(1) Lei 8.177/1991: “Art. 39. Os débitos trabalhistas de qualquer natureza, quando não satisfeitos pelo empregador nas épocas próprias assim definidas em lei, acordo ou convenção coletiva, sentença normativa ou cláusula contratual sofrerão juros de mora equivalentes à TRD acumulada no período compreendido entre a data de vencimento da obrigação e o seu efetivo pagamento”.
(2) ADI 4.357/DF, DJE de 26.9.2014; ADI 4.425/DF, DJE de 19.12.2013.
(3) Rcl 22.012 MC/RS, DJE de 16.10.2015.
Rcl 25980 AgR/RS, rel. Min. Edson Fachin, julgamento em 16.5.2017. (RCL-25980)
Sessões |
Ordinárias |
Extraordinárias |
Julgamentos |
Julgamentos por meio eletrônico* |
Pleno |
17.5.2017 |
18.5.2017 |
3 |
25 |
1ª Turma |
16.5.2017 |
— |
84 |
51 |
2ª Turma |
16.5.2017 |
— |
16 |
80 |
* Emenda Regimental 51/2016-STF. Sessão virtual de 12 a 18 de maio de 2017.
CLIPPING DA R E P E R C U S S Ã O G E R A L
DJE de 15 a 19 de maio de 2017
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 937.595 – SP
RELATOR: MIN. ROBERTO BARROSO
EMENTA: DIREITO PREVIDENCIÁRIO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. READEQUAÇÃO DE BENEFÍCIO CONCEDIDO ENTRE 05.10.1988 E 05.04.1991 (BURACO NEGRO). APLICAÇÃO IMEDIATA DOS TETOS INSTITUÍDOS PELAS EC´S Nº 20/1998 E 41/2003. REPERCUSSÃO GERAL. REAFIRMAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N.1.014.286– SP
RELATOR: MIN. LUIZ FUX
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL DE SERVIDOR PÚBLICO. ARTIGO 40, § 4º, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. PEDIDO DE AVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PRESTADO EM ATIVIDADES EXERCIDAS SOB CONDIÇÕES ESPECIAIS QUE PREJUDIQUEM A SAÚDE OU A INTEGRIDADE FÍSICA DO SERVIDOR, COM CONVERSÃO DO TEMPO ESPECIAL EM COMUM, MEDIANTE CONTAGEM DIFERENCIADA, PARA OBTENÇÃO DE OUTROS BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS. QUESTÃO NÃO ABRANGIDA PELO ENUNCIADO DA SÚMULA VINCULANTE 33. REITERAÇÃO DA CONTROVÉRSIA EM MÚLTIPLOS PROCESSOS. IMPACTO DA DECISÃO NO EQUILÍBRIO FINANCEIRO E ATUARIAL DA PREVIDÊNCIA PÚBLICA. RECONHECIDA A EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.
Decisões Publicadas: 2
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Prisão cautelar - Duração excessiva - Inadmissibilidade (Transcrições)
HC 139.664/GO*
Relator: Ministro Celso de Mello
EMENTA: “HABEAS CORPUS”. PRISÃO CAUTELAR QUE SE PROLONGA POR MAIS DE 04 (QUATRO) ANOS. PACIENTE QUE, EMBORA PRONUNCIADA, SEQUER FOI SUBMETIDA, ATÉ O PRESENTE MOMENTO, A JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI. INADMISSIBILIDADE. EXCESSO DE PRAZO CARACTERIZADO. SITUAÇÃO QUE NÃO PODE SER TOLERADA NEM ADMITIDA. DIREITO PÚBLICO SUBJETIVO DE QUALQUER RÉU, MESMO TRATANDO-SE DE DELITO HEDIONDO, A JULGAMENTO PENAL SEM DILAÇÕES INDEVIDAS NEM DEMORA EXCESSIVA OU IRRAZOÁVEL. DURAÇÃO ABUSIVA DA PRISÃO CAUTELAR QUE TRADUZ SITUAÇÃO ANÔMALA APTA A COMPROMETER A EFETIVIDADE DO PROCESSO E A FRUSTRAR O DIREITO DO ACUSADO À PROTEÇÃO JUDICIAL DIGNA E CÉLERE. PRECEDENTES (RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO – HC 85.237/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.). MAGISTÉRIO DA DOUTRINA (Odone Sanguiné, José Rogério Cruz e Tucci, Luiz Flávio Gomes e Rogério Lauria Tucci). OCORRÊNCIA, NA ESPÉCIE, DE LESÃO EVIDENTE AO “STATUS LIBERTATIS” DA PACIENTE EM RAZÃO DE OFENSA À CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS (ARTIGO 7º, n. 5) E À CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (ART. 5º, INCISO LXXVIII). “HABEAS CORPUS” DEFERIDO.
– Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 – RTJ 180/262- -264 – RTJ 187/933-934), considerada a excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a prisão meramente processual do indiciado ou do réu, mesmo que se trate de crime hediondo ou de delito a este equiparado.
– O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário – não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu –, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei.
– A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa – considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) – significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC 45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.
DECISÃO: Trata-se de “habeas corpus”, impetrado contra decisões que, emanadas do E. Superior Tribunal de Justiça, acham-se consubstanciadas em acórdãos assim ementados:
“’HABEAS CORPUS’. PRISÃO PREVENTIVA. SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR. DOENÇA GRAVE. IMPOSSIBILIDADE DE TRATAMENTO ADEQUADO NA UNIDADE PRISIONAL. FALTA DE COMPROVAÇÃO. INEVIDENTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. PARECER ACOLHIDO.
1. Não comprovada a impossibilidade de recebimento de tratamento adequado no estabelecimento prisional, como na espécie, inviável a concessão da prisão domiciliar com base no art. 318, II, do CPP.
2. Ordem denegada.”
(HC 350.315/GO, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR – grifei)
“’HABEAS CORPUS’. EXCESSO DE PRAZO NA FORMAÇÃO DA CULPA. DEMORA PROVOCADA PELA DEFESA. SÚMULA 64/STJ. INEVIDÊNCIA DE ILEGALIDADE. PARECER ACOLHIDO.
1. Os prazos para a conclusão da instrução criminal não são peremptórios, podendo ser flexibilizados diante das peculiaridades do caso concreto, em atenção e dentro dos limites da razoabilidade.
2. Se a alegada demora foi provocada pela própria defesa, em razão dos diversos recursos interpostos após a decisão de pronúncia, afasta-se o apontado constrangimento ilegal por excesso de prazo. Aplicação da Súmula 64/STJ.
3. Ordem denegada.”
(HC 369.243/GO, Rel. Min. SEBASTIÃO REIS JÚNIOR – grifei)
Sustenta-se, em síntese, neste “writ” constitucional, que a ora paciente estaria sofrendo injusto constrangimento ilegal em seu “status libertatis”, motivado pelo excesso de prazo na duração da custódia preventiva, bem assim por não estar recebendo tratamento de saúde adequado no cárcere.
Busca-se, desse modo, nesta sede processual, a revogação da prisão cautelar da ora paciente ou, subsidiariamente, a concessão de prisão domiciliar para tratamento de saúde, nos termos do artigo 318, inciso II, do Código de Processo Penal” (grifei).
O Juízo de Direito da Vara Judicial da comarca de Itaberaí/GO, ao prestar as informações que lhe foram solicitadas, apresentou os seguintes esclarecimentos:
“Tramita neste Juízo ação penal movida pelo Ministério Público Estadual contra a paciente e seu companheiro, Cléber Antônio Utim, sendo-lhes imputada a conduta descrita no art. 121, § 2º, I e IV, do Código Penal Brasileiro.
Aparecida e Cléber foram denunciados, por, supostamente, em comunhão de interesses na obtenção de seguro de vida da vítima, Núbia Cristina de Paula, ceifar-lhe a vida atirando-a de uma ponte com 10m de altura.
A paciente foi presa preventivamente em 19.4.2013, sendo pronunciada em 12.4.2014, desde quando seu defensor vem incessantemente interpondo recursos em todas as instâncias.
Através do Ofício 760/2015, em 15.12.2015, o diretor da unidade prisional local comunicou que foi apreendido na cela da paciente vasilhame contendo aproximadamente 1kg de sal, que, em tese, estaria sendo ingerido pela detenta, para provocar reações necessárias de atendimento médico, o que sempre acontecia em horários em que o médico da unidade carcerária já não mais ali estava. Ressalte-se que poucos dias antes de tal fato os impetrantes haviam formulado pedido de prisão domiciliar em favor da Sra. Aparecida pelo fato desta ser hipertensa.
Também calha informar que os autos de inquérito que motivaram a presente ação penal permaneceram arquivados por cerca de 10 (dez) anos, por razão de, à época, as testemunhas negarem os fatos, atribuindo-lhes caráter acidental.
Com a decisão de pronúncia, há mais de dois anos, a defesa interpôs recurso em sentido estrito, seguido de inúmeros outros, inclusive direcionados ao Pretório Excelso, tendo todos sido negados.
Atualmente, aguarda-se o trânsito em julgado de recurso interposto no Superior Tribunal de Justiça, a fim de que se dê normal seguimento ao processo criminal.” (grifei)
O Ministério Público Federal, em pronunciamento da lavra da ilustre Subprocuradora-Geral da República Dra. CLÁUDIA SAMPAIO MARQUES, opinou pelo não conhecimento deste “habeas corpus” em parecer assim ementado:
“’HABEAS CORPUS’ SUBSTITUTIVO DE RECURSO PRÓPRIO. DESCABIMENTO. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PRISÃO PREVENTIVA MANTIDA NA PRONÚNCIA E PRESERVADA PELO TJ/GO E STJ. EXCESSO DE PRAZO DA CUSTÓDIA. NÃO CONFIGURAÇÃO. AÇÃO PRINCIPAL QUE TRAMITA COM REGULARIDADE, NÃO OBSTANTE AS INSURGÊNCIAS (INFINDÁVEIS) DA DEFESA. CONCESSÃO DE PRISÃO DOMICILIAR. PLEITO INVIÁVEL. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS DO ART. 318, II, CPP. PARECER PELO NÃO CONHECIMENTO DO ‘WRIT’.” (grifei)
Sendo esse o contexto, passo a examinar a causa ora em julgamento. E, ao fazê-lo, entendo assistir razão aos ora impetrantes no ponto em que sustentam a duração excessiva da prisão cautelar imposta à paciente (quatro anos e trinta e três dias), sem que sequer tenha sido julgada, até o presente momento, pelo Tribunal do Júri da comarca de Itaberaí/GO.
A presente impetração, como precedentemente referido, apoia-se na alegada ocorrência de excesso de prazo na manutenção da custódia cautelar da ora paciente, que já se prolonga, comprovadamente, como assinalado, por mais de 04 (quatro) anos, sem que, nesse ínterim, tenha ela sido submetida a julgamento perante o Tribunal do Júri.
Cumpre acentuar, por oportuno, que a paciente – pronunciada, em 12/04/2014, por suposta prática do crime de homicídio duplamente qualificado (CP, art. 121, § 2º, incisos I e IV) – veio a ser presa, preventivamente, em 19/04/2013.
Impende reiterar, por necessário, que, até esta data, o julgamento da ora paciente perante o Tribunal do Júri ainda não se realizou, não obstante decorrido tão longo período de tempo (mais de 04 anos desde a prisão preventiva em 19/04/2013 ou mais de 03 anos desde a pronúncia em 12/04/2014).
O que me parece grave, no caso ora em análise, considerados todos os aspectos que venho de referir, é que o exame destes autos evidencia que a paciente permanece presa, cautelarmente, até agora, não obstante – insista-se – decorridos mais de quatro (04) anos, sem que sequer tenha sido julgada por seu juiz natural.
Não desconheço que o Supremo Tribunal Federal, em reiteradas decisões, tem afirmado que a superveniência da decisão de pronúncia, por importar em superação de eventual excesso de prazo, afastaria a configuração, quando ocorrente, da situação de injusto constrangimento (HC 100.567/SP, Rel. Min. CÁRMEN LÚCIA – HC 118.065/SP, Rel. Min. RICARDO LEWANDOWSKI – RHC 123.730/AgR-SP, Rel. Min. LUIZ FUX, v.g.).
Impende registrar, por relevante, que esta Suprema Corte – embora assinalando que a prisão cautelar fundada em decisão de pronúncia não tem prazo legalmente predeterminado – adverte, no entanto, que a duração dessa prisão meramente processual está sujeita a um necessário critério de razoabilidade, no que concerne ao tempo de sua subsistência, como o evidenciam decisões proferidas por este Tribunal:
“‘HABEAS CORPUS’ – ADITAMENTO DA DENÚNCIA – ALEGADO CERCEAMENTO DE DEFESA – PRETENDIDA OBSERVÂNCIA DO ART. 384, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPP – INAPLICABILIDADE – ADITAMENTO QUE SE LIMITA A FORMALIZAR NOVA CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA DOS FATOS QUE FORAM DESCRITOS, COM CLAREZA, NA DENÚNCIA – HIPÓTESE DE SIMPLES ‘EMENDATIO LIBELLI’ – POSSIBILIDADE – APLICABILIDADE DO ART. 383 DO CPP – PRISÃO PROCESSUAL – EXCESSO DE PRAZO EM SUA DURAÇÃO – PACIENTES PRESOS, CAUTELARMENTE, HÁ MAIS DE 4 (QUATRO) ANOS – INADMISSIBILIDADE – DESRESPEITO AO POSTULADO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA (CF, ART. 1º, III) – TRANSGRESSÃO À GARANTIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (CF, ART. 5º, LIV) – OFENSA AO DIREITO DO RÉU A JULGAMENTO SEM DILAÇÕES INDEVIDAS (CF, ART. 5º, LXXVIII) – ‘HABEAS CORPUS’ DEFERIDO.
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O EXCESSO DE PRAZO NA DURAÇÃO DA PRISÃO CAUTELAR, MESMO TRATANDO-SE DE DELITO HEDIONDO (OU A ESTE EQUIPARADO), IMPÕE, EM OBSÉQUIO AOS PRINCÍPIOS CONSAGRADOS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, A IMEDIATA CONCESSÃO DE LIBERDADE AO INDICIADO OU AO RÉU.
– Nada justifica a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 – RTJ 180/262-264 – RTJ 187/933-934 – RTJ 195/212-213), considerada a excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a prisão meramente processual do indiciado ou do réu, mesmo que se trate de crime hediondo ou de delito a este equiparado.
– O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário – não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu –, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei.
– A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa – considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) – significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo (RTJ 195/212-213). Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC nº 45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.
– A prisão cautelar – qualquer que seja a modalidade que ostente no ordenamento positivo brasileiro (prisão em flagrante, prisão temporária, prisão preventiva, prisão decorrente de sentença de pronúncia ou prisão motivada por condenação penal recorrível) – não pode transmudar-se, mediante subversão dos fins que a autorizam, em meio de inconstitucional antecipação executória da própria sanção penal, pois tal instrumento de tutela cautelar penal somente se legitima, se se comprovar, com apoio em base empírica idônea, a real necessidade da adoção, pelo Estado, dessa extraordinária medida de constrição do ‘status libertatis’ do indiciado ou do réu. Precedentes.”
(RTJ 201/286-288, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
“O encerramento da instrução criminal supera o excesso de prazo para a prisão processual que antes dele se tenha verificado, mas não elide o que acaso se caracterize pelo posterior e injustificado retardamento do término do processo.”
(RHC 71.954/PA, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)
“Prisão por pronúncia: duração que, embora não delimitada em lei, sujeita-se ao limite da razoabilidade (…).”
(HC 83.977/RJ, Red. p/ o acórdão Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)
“AÇÃO PENAL. Prisão preventiva. Decretação em sentença de pronúncia. Excesso de prazo. Caracterização. Custódia que perdura por mais de quatro (4) anos e quatro (4) meses. Instrução processual ainda não encerrada. Demora não imputável à defesa. Dilação não razoável. Constrangimento ilegal caracterizado. ‘HC’ concedido. Aplicação do art. 5º, LXXVIII, da CF. Precedentes. A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar do réu, sem julgamento da causa, ofende o postulado da dignidade da pessoa humana e, como tal, consubstancia constrangimento ilegal, ainda que se trate da imputação de crime grave.”
(HC 87.676/ES, Rel. Min. CEZAR PELUSO – grifei)
“‘Habeas Corpus’. 1. Pronúncia. Homicídio duplamente qualificado. 2. Alegações de falta de fundamentação do decreto de prisão preventiva e excesso de prazo. 3. Prisão preventiva adequadamente fundamentada na garantia da ordem pública e da aplicação da lei penal, nos termos do art. 312 do CPP. 4. É considerável o transcurso de mais de 3 anos desde a decretação da prisão preventiva e mais de 2 anos da sentença de pronúncia sem julgamento pelo Tribunal do Júri. 5. Ausência de elementos indicativos de que a defesa contribuiu, de qualquer maneira, para a demora processual. 6. A perpetuação temporal de indefinição jurídica quanto à liberdade de locomoção do paciente afeta a própria garantia constitucional da proteção judicial digna, legítima, eficaz e célere (CF, art. 1º, III c/c art. 5º, incisos LIV, LV e LXXVIII). Precedentes. 7. Situação de constrangimento ilegal apta a ensejar o deferimento da ordem. 8. Ordem deferida para revogar a prisão decretada em desfavor do ora paciente, determinando-se a expedição de alvará de soltura, se por outra razão não estiver preso.”
(HC 92.604/SP, Rel. Min. GILMAR MENDES – grifei)
É por essa razão que o Supremo Tribunal Federal, ao apreciar o HC 80.379/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, em que o paciente se encontrava cautelarmente preso havia 02 (dois) anos e 03 (três) meses (bem menos, portanto, que a ora paciente, que se acha recolhida ao sistema prisional há mais de quatro anos), proferiu decisão consubstanciada em acórdão, assim ementado, cujo teor reflete a diretriz jurisprudencial prevalecente nesta Corte em torno da legitimidade do controle jurisdicional sobre o tempo de duração das prisões cautelares:
“O JULGAMENTO SEM DILAÇÕES INDEVIDAS CONSTITUI PROJEÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.
– O direito ao julgamento sem dilações indevidas qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do ‘due process of law’.
O réu – especialmente aquele que se acha sujeito a medidas cautelares de privação da sua liberdade – tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de prazo razoável, sem demora excessiva nem dilações indevidas. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.
– O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário – não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu –, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio sem dilações indevidas e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional.
O EXCESSO DE PRAZO, NOS CRIMES HEDIONDOS, IMPÕE O RELAXAMENTO DA PRISÃO CAUTELAR.
– Impõe-se o relaxamento da prisão cautelar, mesmo que se trate de procedimento instaurado pela suposta prática de crime hediondo, desde que se registre situação configuradora de excesso de prazo não imputável ao indiciado/acusado. A natureza da infração penal não pode restringir a aplicabilidade e a força normativa da regra inscrita no art. 5º, LXV, da Constituição da República, que dispõe, em caráter imperativo, que a prisão ilegal ‘será imediatamente relaxada’ pela autoridade judiciária. Precedentes.”
(RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de segregação cautelar do acusado, considerada a excepcionalidade da prisão processual, mesmo que se trate de crime hediondo (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 – RTJ 180/262-264, v.g.).
É que a prisão de qualquer pessoa, especialmente quando se tratar de medida de índole meramente processual, por revestir-se de caráter excepcional, não pode nem deve perdurar, sem justa razão, por período excessivo, sob pena de consagrar-se inaceitável prática abusiva de arbítrio estatal, em tudo incompatível com o modelo constitucional do Estado Democrático de Direito.
Mostram-se extremamente valiosas, a propósito do tema ora em análise, as observações feitas, em preciosa obra monográfica (“Prisão Cautelar, Medidas Alternativas e Direitos Fundamentais”, p. 463/465 e 467, item n. 3.1, 2014, Forense), por ODONE SANGUINÉ, eminente Desembargador aposentado, hoje Advogado e Professor associado da Faculdade de Direito da UFRGS:
“A prisão cautelar é uma medida provisória, pois se destina a garantir a ordem jurídica até que outras medidas (desenvolvimento regular do processo e a execução da sentença) possam ser tomadas. A sua duração, em princípio, encontra-se em função da duração do processo penal principal, cujo objeto tende a assegurar. A limitação temporal máxima da prisão cautelar tem como fundamento sua natureza de medida cautelar instrumental e excepcional em virtude da presunção de inocência, do princípio de proporcionalidade e do Estado de Direito e atua como um reforço efetivo para todas aquelas garantias concernentes à liberdade física da pessoa humana, de modo que implicará a necessidade de que se extinga quando terminar o processo principal, com ou sem sentença condenatória transitada em julgado, sem a qual não cabe a execução da pena. Como a meta da agilização dos processos principais não se cumpre na praxe judicial, é necessário fixar um prazo máximo para evitar que o imputado seja privado de liberdade por um tempo excessivo por causa de dilações indevidas no curso do processo penal. A existência de um limite temporal à prisão cautelar age tanto como um impulso à acusação para agir rapidamente no julgamento quanto uma proteção ao acusado no sentido de que deve ser minimizada qualquer dilação desnecessária.
O direito fundamental de ser julgado em um prazo razoável ou de ser colocado em liberdade está previsto em diversos Convênios Internacionais: art. 5º, 3 da Convenção Europeia de Direitos Humanos, de 1950; art. 9.1 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, de 1966, em vigor no plano interno desde 1992, e art. 7.5 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969.
A Recomendação Rec (2006) n. 13, adotada em 27.09.2006, pelo Comitê de Ministros do Conselho da Europa, estabelece que ‘é necessário sempre dar prioridade aos casos envolvendo uma pessoa que tenha sido colocada em prisão provisória' (item 24.2). Ademais, ‘em nenhum caso, a prisão provisória deve violar o direito de uma pessoa detida de ser julgada em um prazo razoável’ (item n. 22.3).
A jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos considera que ‘o art. 7.5 da Convenção garante o direito de toda pessoa em prisão preventiva a ser julgada dentro de um prazo razoável ou ser colocada em liberdade, sem prejuízo de que continue o processo. Esta norma impõe limites temporais à duração da prisão preventiva e, em consequência, às faculdades do Estado para assegurar os fins do processo mediante esta medida cautelar’. Para a Corte Interamericana, ‘quando o prazo de prisão preventiva ultrapassa o razoável, o Estado poderá limitar a liberdade do imputado com outras medidas menos lesivas que assegurem seu comparecimento ao julgamento, distintas da privação da liberdade. Este direito do indivíduo traz consigo, por sua vez, uma obrigação judicial de tramitar com maior diligência e presteza os processos penais nos quais o imputado se encontre privado da liberdade. Do princípio de presunção de inocência reconhecido no artigo 8.2 da Convenção, deriva a obrigação estatal de não restringir a liberdade do detido mais além dos limites estritamente necessários para assegurar que não impedirá o desenvolvimento eficiente das investigações e que não elidirá a ação da justiça. A prisão preventiva é uma medida cautelar, não punitiva. Constitui, ademais, a medida mais severa que se pode impor ao imputado. Por isso, se deve aplicar excepcionalmente. A regra deve ser a liberdade do processado enquanto se resolve acerca de sua responsabilidade penal.
A jurisprudência do Tribunal Constitucional Espanhol considera que a verdadeira razão para a exigência de um prazo máximo para a prisão cautelar é a de oferecer uma garantia de segurança jurídica ao atingido pela medida cautelar e contribuir a evitar dilações indevidas (…).
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A razoável duração do processo penal constitui um princípio que por natureza tende a infringir a tradicional dialética dicotômica entre garantia e eficiência. Embora intrinsecamente ligado à finalidade de economia processual, representa uma das garantias qualificadas do ‘devido processo legal’, traduzindo-se, no âmbito penal, na exigência de evitar que uma pessoa submetida a uma acusação permaneça um tempo demasiado na incerteza da sua sorte e, contemporaneamente, na consagração de um princípio geral de boa administração da justiça, com o qual se visa garantir o correto exercício dos direitos fundamentais do acusado.
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(…) A exigência de controle do juiz sobre o tempo de prisão constitui providência que dá efetiva vigência ao princípio constitucional da duração razoável do processo (art. 5º, inciso LXXVIII) (…).” (grifei)
É preciso reconhecer, portanto, que a duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém, como sucede na espécie, ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa – considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) – significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo.
Ou, em outras palavras, cumpre enfatizar que o excesso de prazo na duração irrazoável da prisão meramente processual de qualquer pessoa, notadamente quando não submetida a julgamento por efeito de obstáculo criado pelo próprio Estado, revela-se conflitante com esse paradigma ético-jurídico conformador da própria organização institucional do Estado brasileiro.
Cabe referir, ainda, por relevante, que a Convenção Americana sobre Direitos Humanos – tendo presente o estado de tensão dialética que existe entre a pretensão punitiva do Poder Público, de um lado, e a aspiração de liberdade inerente às pessoas, de outro – prescreve, em seu Art. 7º, n. 5, que “Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade (…)” (grifei).
Na realidade, o Pacto de São José da Costa Rica constitui instrumento normativo destinado a desempenhar um papel de extremo relevo no âmbito do sistema interamericano de proteção aos direitos básicos da pessoa humana, qualificando-se, sob tal perspectiva, como peça complementar e decisiva no processo de tutela das liberdades públicas fundamentais.
O réu – especialmente aquele que se acha sujeito a medidas cautelares de privação de sua liberdade – tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de um prazo razoável, sob pena de caracterizar-se situação de injusto constrangimento ao seu “status libertatis”, como já o reconheceu esta Suprema Corte ao deferir o HC 84.254/PI, Rel. Min. CELSO DE MELLO, em julgamento no qual a colenda Segunda Turma, por votação unânime, concedeu liberdade ao paciente que se encontrava submetido à prisão cautelar havia 04 (quatro) anos, 01 (um) mês e 04 (quatro) dias, sem julgamento perante órgão judiciário competente, entendimento esse reiterado também pela Egrégia Segunda Turma do Tribunal, quando da concessão do HC 83.773/SP, Rel. Min. CELSO DE MELLO, em face de excesso de prazo da prisão cautelar do paciente, que se prolongava, abusivamente, naquele caso, por 04 (quatro) anos e 28 (vinte e oito) dias.
Como bem acentua JOSÉ ROGÉRIO CRUZ E TUCCI (“Tempo e Processo – Uma análise empírica das repercussões do tempo na fenomenologia processual – civil e penal”, p. 87/88, item n. 3.5, 1998, RT), “o direito ao processo sem dilações indevidas” – além de qualificar-se como prerrogativa reconhecida por importantes Declarações de Direitos (Convenção Americana sobre Direitos Humanos, art. 7º, ns. 5 e 6; Convenção Europeia para Salvaguarda dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais, art. 5, n. 3, v.g.) – representa expressiva consequência de ordem jurídica que decorre da cláusula constitucional que a todos assegura a garantia do devido processo legal.
Isso significa, portanto, que o excesso de prazo, analisado na perspectiva dos efeitos lesivos que dele emanam – notadamente daqueles que afetam, de maneira grave, a posição jurídica de quem se acha cautelarmente privado de sua liberdade –, traduz, na concreção de seu alcance, situação configuradora de injusta restrição à garantia constitucional do “due process of law”, pois evidencia, de um lado, a incapacidade de o Poder Público cumprir o seu dever de conferir celeridade aos procedimentos judiciais e representa, de outro, ofensa inequívoca ao “status libertatis” de quem sofre a persecução penal movida pelo Estado.
A respeito desse específico aspecto da controvérsia, revela-se valiosa a observação de LUIZ FLÁVIO GOMES (“O Sistema Interamericano de Proteção dos Direitos Humanos e o Direito Brasileiro”, p. 242/245, 2000, RT), cujo magistério – expendido a propósito da garantia que assiste a qualquer acusado de ser julgado em prazo razoável, sem demora excessiva ou sem dilações indevidas – expõe as seguintes considerações:
“Nossa Constituição Federal expressamente não prevê a garantia do encerramento do processo em prazo razoável, mas, como sabemos, contemplou não somente a previsão genérica do devido processo legal (CF, art. 5º, LIV), senão também a regra de que os direitos e garantias nela expressamente contemplados não excluem outros decorrentes dos tratados internacionais (art. 5º, § 2º).
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A Convenção Americana sobre Direitos Humanos, por seu turno, enfatiza que ‘Toda pessoa tem direito a ser ouvida, com as devidas garantias e dentro de um prazo razoável...’ (art. 8.1). No que diz respeito ao preso: ‘Toda pessoa detida ou retida deve ser conduzida, sem demora, à presença de um juiz ou outra autoridade autorizada pela lei a exercer funções judiciais e tem direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta em liberdade...’ (art. 7.5); ‘Toda pessoa privada da liberdade tem direito a recorrer a um juiz ou tribunal competente, a fim de que este decida, sem demora...’ (art. 7.6).
Em harmonia com esses textos internacionais, é bem verdade que o nosso Código de Processo Penal contém um conjunto de dispositivos (CPP, art. 799 a 801) que cuida da necessidade do cumprimento dos prazos, estabelecendo inclusive sanções em caso de violação. Porém o que mais sobressai em conformidade com a valoração doutrinária é sua total e absoluta ‘inocuidade’: os prazos não são, em geral, cumpridos e muito raramente aplica-se qualquer sanção.
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De um aspecto da garantia de ser julgado em prazo razoável, a jurisprudência brasileira, em geral, vem cuidando com certa atenção: trata-se do excesso de prazo no julgamento do réu preso. Há constrangimento ilegal (CPP, art. 648) quando alguém está preso por mais tempo do que determina a lei. Com base nesse preceito, o direito jurisprudencial criou a regra de que o julgamento do réu preso, em primeiro grau, tem que acontecer no prazo de 81 dias (que é a soma de todos os prazos processuais no procedimento ordinário; são outros os prazos nos procedimentos especiais). Havendo excesso, sem justificação, coloca-se o acusado em liberdade, sem prejuízo do prosseguimento do processo.” (grifei)
Extremamente oportuno referir, ainda, neste ponto, o douto magistério do eminente e saudoso Professor ROGÉRIO LAURIA TUCCI (“Direitos e Garantias Individuais no Processo Penal Brasileiro”, p. 249/254, itens ns. 10.1 e 10.2, 2ª ed., 2004, RT), que oferece importante reflexão sobre o tema, cujo significado – por envolver o reconhecimento do direito a julgamento sem dilações indevidas – traduz uma das múltiplas projeções que emanam da garantia constitucional do devido processo legal:
“Outra ‘garantia’ que se encarta no ‘devido processo penal’ é a referente ao desenrolamento da ‘persecutio criminis’ em ‘prazo razoável’.
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Ora, nosso País é um dos signatários da ‘Convenção americana sobre direitos humanos’, assinada em San José, Costa Rica, no dia 22.11.1969, e cujo art. 8.º, 1, tem a seguinte (também ora repetida) redação: ‘‘Toda pessoa tem direito de ser ouvida’ com as devidas garantias e ‘dentro de um prazo razoável’ por um juiz ou tribunal competente, independente e imparcial, estabelecido por lei anterior, ‘na defesa de qualquer acusação penal contra ela formulada’ (…).
Por via de consequência, dúvida não pode haver acerca da determinação (…) na Carta Magna brasileira em vigor, do término de qualquer procedimento, especialmente o relativo à persecução penal, em ‘prazo razoável’.
Essa, aliás, é concepção que se universalizou, sobretudo a partir da ‘Convenção Europeia para salvaguarda dos direitos do homem e das liberdades fundamentais’, como anota JOSÉ ROGÉRIO CRUZ E TUCCI, asserindo que, desde a edição, em 04.11.1950, desse diploma legal supranacional, ‘‘o direito ao processo sem dilações indevidas’ passou a ser concebido como um direito subjetivo constitucional, de caráter autônomo, de todos os membros da coletividade (incluídas as pessoas jurídicas) à ‘tutela jurisdicional dentro de um prazo razoável’, decorrente da proibição do ‘non liquet’, vale dizer, do dever que têm os agentes do Poder Judiciário de julgar as causas com estrita observância das normas de direito positivo’.
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Afigura-se, com efeito, de todo inaceitável a delonga na finalização do processo de conhecimento (especialmente o de caráter condenatório), com a ultrapassagem do tempo necessário à consecução de sua finalidade, qual seja a de definição da relação jurídica estabelecida entre o ser humano, membro da comunidade, enredado na ‘persecutio criminis’, e o Estado: o imputado tem, realmente, direito ao pronto solucionamento do conflito de interesses de alta relevância social que os respectivos autos retratam, pelo órgão jurisdicional competente.
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Realmente, tendo-se na devida conta as graves conseqüências psicológicas (no plano subjetivo), sociais (no objetivo), processuais, e até mesmo pecuniárias, resultantes da persecução penal para o indivíduo nela envolvido, imperiosa torna-se a agilização do respectivo procedimento, a fim de que elas, tanto quanto possível, se minimizem, pela sua conclusão num ‘prazo razoável’.” (grifei)
Essa percepção da matéria encontra pleno apoio na jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou no tema ora em exame, tanto que se registrou nesta Corte, em diversas decisões, a concessão de ordens de “habeas corpus” em situações nas quais o excesso de prazo – reconhecido em tais julgamentos – foi reputado abusivo por este Tribunal (RTJ 181/1064, Rel. Min. ILMAR GALVÃO).
Tal entendimento também foi reiterado pelo Supremo Tribunal Federal – e a ordem de “habeas corpus”, da mesma forma, foi deferida – em hipóteses nas quais o excesso de prazo pertinente à prisão cautelar revelava-se substancialmente inferior ao que se registra na presente impetração: 02 (dois) anos, 04 (quatro) meses e 08 (oito) dias (HC 84.662/BA, Rel. Min. EROS GRAU); 01 (um) ano, 05 (cinco) meses e 15 (quinze) dias (HC 79.789/AM, Rel. Min. ILMAR GALVÃO); 01 (um) ano e 03 (três) meses (HC 84.907/SP, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE); 01 (um) ano e 05 (cinco) dias (HC 84.181/RJ, Rel. Min. MARCO AURÉLIO); 10 (dez) meses e 21 (vinte e um) dias (HC 83.867/PB, Rel. Min. MARCO AURÉLIO); 04 (quatro) meses e 10 (dias) (RTJ 118/484, Rel. Min. CARLOS MADEIRA).
Impende rememorar, neste ponto, por oportuno, julgamento plenário do Supremo Tribunal Federal, proferido sob a égide do inciso LXXVIII do art. 5º da Constituição Federal (na redação dada pela EC nº 45/2004), em que esta Corte, examinando situação virtualmente idêntica à que ora se analisa na espécie, igualmente reconheceu inadmissível, porque abusivo, o excesso de prazo na duração da prisão cautelar do paciente, que, no precedente ora invocado (HC 85.237/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO), estava preso, ainda sem julgamento pelo Júri (embora já pronunciado), havia quase quatro (04) anos e meio, valendo referir, ante a sua extrema pertinência, o teor do ato decisório em questão, consubstanciado em acórdão assim ementado:
“O EXCESSO DE PRAZO, MESMO TRATANDO-SE DE DELITO HEDIONDO (OU A ESTE EQUIPARADO), NÃO PODE SER TOLERADO, IMPONDO-SE AO PODER JUDICIÁRIO, EM OBSÉQUIO AOS PRINCÍPIOS CONSAGRADOS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA, O IMEDIATO RELAXAMENTO DA PRISÃO CAUTELAR DO INDICIADO OU DO RÉU.
– Nada pode justificar a permanência de uma pessoa na prisão, sem culpa formada, quando configurado excesso irrazoável no tempo de sua segregação cautelar (RTJ 137/287 – RTJ 157/633 – RTJ 180/262-264 – RTJ 187/933-934), considerada a excepcionalidade de que se reveste, em nosso sistema jurídico, a prisão meramente processual do indiciado ou do réu, mesmo que se trate de crime hediondo ou de delito a este equiparado.
– O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário – não derivando, portanto, de qualquer fato procrastinatório causalmente atribuível ao réu –, traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas (CF, art. 5º, LXXVIII) e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional, inclusive a de não sofrer o arbítrio da coerção estatal representado pela privação cautelar da liberdade por tempo irrazoável ou superior àquele estabelecido em lei.
– A duração prolongada, abusiva e irrazoável da prisão cautelar de alguém ofende, de modo frontal, o postulado da dignidade da pessoa humana, que representa – considerada a centralidade desse princípio essencial (CF, art. 1º, III) – significativo vetor interpretativo, verdadeiro valor-fonte que conforma e inspira todo o ordenamento constitucional vigente em nosso País e que traduz, de modo expressivo, um dos fundamentos em que se assenta, entre nós, a ordem republicana e democrática consagrada pelo sistema de direito constitucional positivo. Constituição Federal (Art. 5º, incisos LIV e LXXVIII). EC 45/2004. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência.
– O indiciado ou o réu, quando configurado excesso irrazoável na duração de sua prisão cautelar, não podem permanecer expostos a tal situação de evidente abusividade, ainda que se cuide de pessoas acusadas da suposta prática de crime hediondo (Súmula 697/STF), sob pena de o instrumento processual da tutela cautelar penal transmudar-se, mediante subversão dos fins que o legitimam, em inaceitável (e inconstitucional) meio de antecipação executória da própria sanção penal. Precedentes.”
(RTJ 195/212-213, Rel. Min. CELSO DE MELLO, Pleno)
Cabe também assinalar que o Supremo Tribunal Federal, revelando extrema sensibilidade a propósito de situações anômalas derivadas da superação abusiva e irrazoável do prazo de duração de prisões meramente cautelares, tem conhecido do pedido de “habeas corpus”, até mesmo quando não examinada essa específica questão pelo Tribunal de jurisdição inferior, como resulta claro das decisões a seguir mencionadas:
“RECURSO EM ‘HABEAS CORPUS’. LIBERDADE PROVISÓRIA. EXCESSO DE PRAZO. CONHECIMENTO DE OFÍCIO DA MATÉRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXTENSÃO DE LIBERDADE PROVISÓRIA.
O Tribunal tem admitido conhecer da questão do excesso de prazo quando esta se mostra gritante, mesmo que o tribunal recorrido não a tenha examinado.
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Recurso provido em parte. ‘Habeas corpus’ concedido de ofício.”
(RHC 83.177/PI, Rel. Min. NELSON JOBIM – grifei)
“– ‘Habeas corpus’. Excesso de prazo para o encerramento da instrução criminal.
– ‘Habeas corpus’ que não se conhece por não ser caso de pedido originário a esta Corte, mas que se concede, ‘ex officio’, por gritante excesso de prazo.”
(HC 59.629/PA, Rel. Min. MOREIRA ALVES – grifei)
Todos os aspectos ora ressaltados põem em evidência um fato que assume extremo relevo jurídico, consistente na circunstância de que se registra, na espécie, evidente excesso de prazo, eis que a prisão cautelar da ora paciente, sem causa legítima, excedeu período que ultrapassa quatro (04) anos de duração, sem que, até o presente momento, e por razões exclusivamente imputáveis ao Estado, essa mesma paciente tenha sido julgada por seu juiz natural: o Tribunal do Júri.
Bem por isso é que a EC nº 45/2004 – que instituiu a “Reforma do Judiciário” – introduziu o inciso LXXVIII no art. 5º da Constituição da República, consagrando, de modo formal, uma expressiva garantia enunciada nos seguintes termos:
“LXXVIII – a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” (grifei)
Nem se diga, finalmente, que a circunstância de a acusação penal envolver a suposta prática de crime hediondo (como o delito de homicídio qualificado, p. ex.) impediria a ré de invocar, em seu favor, a prerrogativa da liberdade, especialmente naquelas situações em que o tempo de prisão cautelar excede, de maneira abusiva, como no caso, os limites razoáveis de duração.
É preciso enfatizar, uma vez configurado excesso irrazoável na duração da prisão cautelar do réu, que este não pode permanecer exposto a uma situação de evidente abusividade, ainda que se cuide de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo (Súmula 697/STF), sob pena de o instrumento processual da tutela cautelar penal transmudar-se, mediante subversão dos fins que o legitimam, em inaceitável (e inconstitucional) meio de antecipação executória da própria sanção penal:
“A gravidade do crime imputado, um dos malsinados ‘crimes hediondos’ (Lei 8.072/90), não basta à justificação da prisão preventiva, que tem natureza cautelar, no interesse dos interesses do desenvolvimento e do resultado do processo, e só se legitima quando a tanto se mostrar necessária: não serve à prisão preventiva, nem a Constituição permitiria que para isso fosse utilizada, a punir sem processo, em atenção à gravidade do crime imputado, do qual, entretanto, ‘ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória’ (CF, art. 5º, LVII).”
(RTJ 137/287, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)
“Caracterizado o excesso de prazo na custódia cautelar do paciente, mesmo em face da duplicação, instituída pelo art. 10 da Lei nº 8.072/90, dos prazos processuais previstos no art. 35 da Lei nº 6.368/76, é de deferir-se o ‘habeas corpus’ para que seja relaxada a prisão, já que a vedação de liberdade provisória para os crimes hediondos não pode restringir o alcance do art. 5º, LXV, da Carta da República, que garante o relaxamento da prisão eivada de ilegalidade.”
(RTJ 157/633, Rel. Min. ILMAR GALVÃO – grifei)
“Prisão preventiva: à falta da demonstração em concreto do ‘periculum libertatis’ do acusado, nem a gravidade abstrata do crime imputado, ainda que qualificado de hediondo, nem a reprovabilidade do fato, nem o conseqüente clamor público constituem motivos idôneos à prisão preventiva: traduzem, sim, mal disfarçada nostalgia da extinta prisão preventiva obrigatória.”
(RTJ 172/184, Rel. Min. SEPÚLVEDA PERTENCE – grifei)
“A ACUSAÇÃO PENAL POR CRIME HEDIONDO NÃO JUSTIFICA A PRIVAÇÃO ARBITRÁRIA DA LIBERDADE DO RÉU.
– A prerrogativa jurídica da liberdade – que possui extração constitucional (CF, art. 5º, LXI e LXV) – não pode ser ofendida por atos arbitrários do Poder Público, mesmo que se trate de pessoa acusada da suposta prática de crime hediondo, eis que, até que sobrevenha sentença condenatória irrecorrível (CF, art. 5º, LVII), não se revela possível presumir a culpabilidade do réu, qualquer que seja a natureza da infração penal que lhe tenha sido imputada.”
(RTJ 187/933-934, 933, Rel. Min. CELSO DE MELLO)
Sendo assim, em face das razões expostas, e considerando os elementos produzidos nestes autos, defiro o pedido de “habeas corpus”, em ordem a determinar a soltura da ora paciente, se por al não estiver presa, eis que excessivo o período de duração da prisão cautelar a que está submetida nos autos da Ação Penal nº 0307517-12.2003.8.09.0079, ora em curso perante o Juízo de Direito da Vara Judicial da comarca de Itaberaí/GO.
Comunique-se, com urgência, transmitindo-se cópia da presente decisão ao E. Superior Tribunal de Justiça (HC 350.315/GO e HC 369.243/GO), ao E. Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (HC 0243068-34.2016.8.09.0000) e ao Juízo de Direito da Vara Judicial da comarca de Itaberaí/GO (Ação Penal nº 0307517-12.2003.8.09.0079).
Publique-se.
Brasília, 22 de maio de 2017.
Ministro CELSO DE MELLO
Relator
* decisão publicada no DJE em 24.5.2017.
Secretaria de Documentação – SDO
Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados – CJCD
O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art. 102 da Constituição da República. É composto por onze Ministros, todos brasileiros natos (art. 12, § 3º, inc. IV, da CF/1988), escolhidos dentre cidadãos com mais de 35 e menos de 65 anos de idade, de notável saber jurídico e reputação ilibada (art. 101 da CF/1988), e nomeados pelo Presidente da República, após aprovação da escolha pela maioria absoluta do Senado Federal (art. 101, parágrafo único, da CF/1988). Entre suas principais atribuições está a de julgar a ação direta de inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual, a ação declaratória de constitucionalidade de lei ou ato normativo federal, a arguição de descumprimento de preceito fundamental decorrente da própria Constituição e a extradição solicitada por Estado estrangeiro.
Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STF - Supremo Tribunal Federal. Informativo 865 do STF - 2017 Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 19 maio 2017, 18:15. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Informativos dos Tribunais/50786/informativo-865-do-stf-2017. Acesso em: 23 dez 2024.
Por: STF - Supremo Tribunal Federal Brasil
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